MOTE:

"Eu sou uma autêntica bomba abandonada! Temo explodir a qualquer momento..."
- Frase de um ex-combatente, anónimo.

Amigos

quarta-feira, 8 de maio de 2013

A DESPEDIDA





















 
Adeus mãe, fica com a saudade
Do teu filho que está a partir
Vou para longe, vou para a guerra
Dizem que a pátria vou servir

Até ao meu regresso amigos
Não pedi, sou obrigado a partir
Mandaram-me matar “os inimigos”
Esta obrigação não irei cumprir

Levo-te comigo minha cidade
Talvez um dia, voltarei
Será com muita saudade
Que sempre te recordarei

Vocês todos vão comigo
Por este adentro Além-mar
Levo comigo a esperança
De um dia, poder voltar.

Adeus meu amor
Minha grande paixão
É tão imensa esta dor
De tão forçada separação

(Algures alto-mar, 1965)
António D. Lima


 

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

"PESADELO", de José Fanha

A guerra é um pesadelo
que te ocupa a cabeça toda a noite
com cadáveres caminhando destroçados
pelos interstícios do sono
e bombas que rebentam e espalham
fel e pregos
em todas as cartilagens,
e uma procissão de fístulas
deixando a sua baba pestilenta
pelo peito, pela boca, pelos joelhos.

A guerra é um pesadelo
onde as pombas choram
e os cavalos uivam com horror
ao ver as patas arrancadas a fugir do corpo.

A guerra é um pesadelo
onde as prostitutas implodem
na mais cruel virgindade
e a criança voa,
cirurgicamnete fragmentada,
como uma romã perdida do seu ser.

E quando a noite se esvai e a manhã chega
para te abraçarcom os seus olhos
trémulos de água
e um cheiro branco a pão,
descobres que o pesadelo
e a guerra
e os homens que fazem a guerra
continuam a espalhar a sua sementeira negra
pelas searas mais perdidas
deste mundo.

José Fanha
In: " José Fanha Poesia"
Editora Lápis de Memórias,
Coimbra, 2012